A guerra do Paraguay (o filme de Luiz Rosemberg Filho)
Um filme de agora. Aos que vão morrer. Em nome do quê em nome de quem. . O mais extraordinário conceito dos anos 60 foi o reconhecimento da autodeterminação dos povos. Dos povos não de países não de estados. Quantos povos são reprimidos em cada país?
: – Eu vim da guerra. Vencemos. Eu sou um soldado do Império! E bate o tambor.
Desde o início tambores ressoam uma forte sinfonia em meio a sons de guerras.
: – Um soldado do Império o que fiz foi cumprir minha missão chacinei gentes como nunca tinha visto. Eu sou um patriota!
E encontra um soldado derrotado por ele derrotante. A esgrima de diálogos no envolvimento de uma dramaturgia plena e explícita em bailados de vida e morte.
E encontra a vida. A vida veio vindo numa carroça atemporal que contém o mundo puxado à força das mulheres. E então assistiremos ao duelo sem nem mais nem menos sequer uma palavra . Seu segredo é a depuração.
E então assistimos ao combate entre a bela e a fera. Sentimentos pensamentos eternos na parede bestial dos que servem ao poder. Servís repetidores das cartilhas da opressão.
Entre as belas e a fera. A bela mais velha sábia de humanidades e a menina mais nova. A menina é primal. Como falar de interpretações tão densas tão irmanadas nos personagens que vestem. Uns e outros são como cada um um só. Pega-se tão só os poucos personagens e desenha-se o mundo. Nem mais nem menos.
E mais o ator câmera que é só o olhar contracenando no drama mais perto ou mais longe recortando cenários espaços e perspectivas e reconhecido pela bela mas não pela fera. A bela fala conosco e fala por nós. A fera nem nos vê. Sons de guerras.
Lembrei Guernica. Nem vou falar das referências. Lembrei Bergman. Lembrei Beckett. Brecht é proclamado. A fábula é universal. A aldeia é o mundo.
A riqueza no entoar das falas nos permite acompanhar nítidamente os embates do pensamento os mistérios da poesia contra a barbárie. A soldadesca defende-se com seus tenebrosos méritos de porta medalhas tantos matei mas o soldado do Império jamais verá o imperador. Ufana-se de não ser senão as vidas que ceifou.
Como se explica o império bonachão o último a libertar os escravos depois de chacinar país afora todos os movimentos sociais populares mandar matar e morrer além fronteiras.
A história que celebram não é um panteão de heróis é um mísero desfile de carrascos e assassinos a espalhar fomes e misérias. E que traiçoeira se defende com Deus Pátria e Família.
E parece enternecer-se com a menina seu oposto. A bêsta é atraída pelo que acha que é o frescor da inocência. Mas a menina é primal e devolve-lhe o bordão: um soldado do império num tom único de desdém e asco. Sua única frase em um tom único jamais visto.
A bêsta leva flores à mais velha. A que confronta e demole sua missão de guerra. Ela é a vida.
Não às guerras! Qualquer guerra. Guerra nenhuma. Em nome do quê em nome de quem? A paz desarma a guerra? A guerra azuldanubeia-se com a paz? A atroz fatalidade a crueldade cumpre-se.
Mas o nosso filme preserva e eterniza o libelo da paz. Ontem no passado hoje no presente as máquinas da guerra em toda parte. Já nem mais se vai à guerra manda-se a guerra nas bombas nos bancos nas telas nas tevês nos ares.
Como às guerras responder? Resistindo e afirmando emocionado o libelo da paz malgrado todos os pesares. A ninguém é dado erguer a mão contra o seu todos nós semelhantes. A humanidade um dom da vida é semelhante a tudo que vive.
Guerras jamais!
Rio, 19 de fevereiro de 2016. Sergio Santeiro.